A Comissão de Direito Médico, Sanitário e Defesa da Saúde (CDMSDS), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO), realizou, durante toda à tarde de hoje, o evento “Debatendo o Uso da Fosfoetanolamina e o uso racional de medicamentos. O encontro, coordenado pela presidente da CDMS, Ana Lúcia Amorim, contou com a presença de representantes do Cremego, Hospital Araújo Jorge (HAJ), Vigilância Sanitária Municipal, Secretaria Estadual de Saúde (SES), Sindicato dos Farmacêuticos no Estado de Goiás (SINFAR) e entidades pró uso da substância, chamada popularmente de “pílula do câncer”.
A presidente do SINFAR, Lorena Baia, ressaltou, durante a discussão, que a instituição defende o uso racional de medicamentos e que a sociedade faça uso de produtos que sejam seguros e efetivos. “A Fosfoetanolamina não se trata de um medicamento, e sim de uma substância, ainda não registrada na Anvisa. Ainda assim, existem relatos de pessoas que utilizaram, e se “curaram” do câncer. No entanto, esses relatos isolados têm pouco valor científico, uma vez que não são bem conhecidas as características dos pacientes e da doença tratada, as condições em que a substância foi usada, qual a dose e frequência de administração e nem se outros medicamentos estavam sendo utilizados concomitantemente. Muitas pessoas aguardam ansiosas por novos tratamentos para o câncer e várias outras doenças. Entretanto, não é coerente a utilização de substâncias cujos efeitos em humanos ainda não são bem conhecidos, uma vez que o risco do uso pode superar os benefícios”.
A farmacêutica alertou ainda que para que qualquer medicamento seja utilizado com segurança, existe um longo processo de pesquisa, segmentado em várias etapas, que se inicia com a descoberta de uma nova substância e vai até o registro de um medicamento inovador pelas agências de regulação sanitária. “O rigor para a liberação de uma substância no mercado é uma necessidade de controle para proteger a população de um mal maior. Nesse sentido o Sindicato torce para que estudos apresentem desfechos positivos para a população”.
Segundo uma pesquisa da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), com 398 médicos da área, cerca de 95% dos profissionais não recomendam uso da fosfoetanolamina sintética, por considerar que os dados disponíveis sobre o composto são insuficientes para que o tratamento seja oferecido. De acordo com o advogado Jordão Horácio, a substância carece de ser submetida a todos os protocolos estabelecidos pela chamada “boa ciência” que atestem a segurança, a qualidade e eficácia do produto. Ele alerta que a liberação da fosfoetanolamina por força de lei abre um precedente perigoso. “Qualquer laboratório irá se sentir no direito de se dirigir ao Congresso para liberar qualquer produto apenas por ter funcionado em A ou B, mas também entendo o direito do paciente de lutar pela vida. No entanto, acredito que isso deve ser feito de maneira segura, só se as terapias tradicionais já tiverem se esgotado”, explica.
O presidente do Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego), Aldair Novato Silva, diz que a substância ainda não tem comprovação científica e não é mais eficaz do que outras que já existem. “Não conhecemos as indicações, implicações do seu uso”, aponta. Em vista disso, ele alerta para o perigo dos efeitos colaterais. Por isso, explica que pelo código de ética os médicos não podem prescrever uma substância que não passou por testes e avaliação da Anvisa, para comprovar sua real eficácia e verificar seus riscos, sendo apenas possível via ordem judicial
A favor do uso
Em contrapartida, representantes de dois movimentos em prol do uso da Fosfoetanolamina Sintética: “Fosfoetanolamina Goiás” e “Viva Fosfo”, defendem o uso da substância. “Necessitamos convencer a OAB desta necessidade de liberação da única chance de vida de milhares de pacientes, que hoje travam a luta pela sua sobrevivência frente a esta doença tão nefasta”, diz o representante do movimento Fosfoetanolamina Sintética Goiás, Reginaldo Barbosa.
A substância
A fosfoetanolamina foi descoberta ainda na década de 30 e há mais de 20 anos vinha sendo objeto de estudo do professor aposentado Gilberto Orivaldo Chierice, então ligado ao Grupo de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros da USP, campus de São Carlos. Algumas pessoas tiveram acesso gratuito às cápsulas contendo a substância, produzidas pelo professor, porém sem aprovação da Anvisa. Esses pacientes usavam a pílula como se fosse um medicamento contra o câncer. Em junho de 2014, uma portaria da USP determinou que substâncias em fase experimental deveriam ter todos os registros antes de serem distribuídas à população. Em abril deste ano, a presidente permitiu o uso, da fosfoetanolamina, mesmo antes de ser registrada e regulamentada pela Anvisa. O Laboratório PDT Pharma, de Cravinhos (SP), é o laboratório autorizado pelo governo de São Paulo para sintetizar a substância.